sábado, 7 de outubro de 2023

Mais uma mãe querida

 Ela era a amiga mais próxima da minha mãe. E quando eu fiquei sozinha ela me acolheu. Devo muito a essa querida tia: o gosto pela leitura foi incentivado por ela, que e emprestava livros e mais livros que eu lia com disposição. Com ela aprendi a fazer um risoto com arroz agulhinha, açafrão e queijo, que ficava amarelinho e delicioso. Nunca mais tentei fazê-lo. Foi ela que garantiu que eu tivesse uma festa de quinze anos e fez meu vestido e os enfeites de decoração. Era um vestido longo, azul turquesa, com um cinto largo com margaridas bordadas. Infelizmente, ao que parece, ninguém garantiu uma foto para a recordação... 

Um dos sonhos mais impressionantes logo após a morte da minha mãe foi dela e comigo. Acordei já pensando que queria ver a tia Carminha. Ela morava em um apartamento nas Perdizes e eu ia vê-la com alguma frequência. Neste dia, sem combinar, fui até lá e ao abrir a porta para mim ela começou a chorar, emocionada. Me contou que naquela noite havia sonhado com a minha mãe. Ela atendia a porta de seu apartamento e minha mãe estava lá, lhe entregando um enorme buquê de rosas! Não sei se esta lembrança é real ou se foi criada pela minha imaginação. Gosto de acreditar que foi uma das mensagens enviadas pela minha mãe, garantindo que me amava.

Deste apartamento também tenho uma lembrança assustadora e angustiante. Era em um andar alto - 14º ou 16º - e um dia meu pai foi me buscar, já no fim da tarde, ou a noite. Acabou a luz e, consequentemente, o elevador deixou de funcionar. Naquele tempo geradores não eram comuns. A escada era toda com paredes de vidro,  o que garantia a entrada de alguma luz assim como uma bela e/ou apavorante vista do exterior. Para mim foi assustador. Talvez venha daí meu medo de altura. Ou eu já tinha e foi reforçado. Sem nenhuma chance de escapar, meu pai queria ir embora e não permitiu que eu não fosse com ele, desci todos aqueles andares olhando para o abismo... Tive pesadelos com altura por muitos anos. Até a vida adulta. Quando meus filhos eram pequenos sonhava que estava andando em andaimes de construção e me forçava a isso porque era a única forma de escapar de alguma coisa...

Em férias, fui passar alguns dias com eles no Guarujá. Tão férias!!!! Ficava na praia o tempo que quisesse. Voltava para o apartamento e minha tia me esperava  sempre bem humorada, alegre, com uma comida deliciosa pronta e dicas de beleza: casca de melancia no rosto para aplacar o calor do bronzeamento é a única que me lembro. Pelo carinho dela ter me esperado com as cascas geladinhas... 

Penso que foi ela a única pessoa que leu os meus diários. E os devolveu com carinho, cuidado, guardando meus segredos e sendo sempre solidária com as minhas dores. 

Quando fiz vinte e um anos recebi do meu tio, marido desta querida, um lindo ramalhete de flores, entregue pela floricultura, coisa cara e rara naquela época eu acho, com um cartão que mesmo sem ter guardado nunca me esqueci: "Bem-vinda à maioridade legal. Parabéns". Ele era advogado e aquele gesto de atenção e carinho me surpreendeu e emociona até hoje.  Agora penso que deveria ter lido esta mensagem como um aviso de que eu poderia tocar a minha vida livremente a partir daquela data... mas, idade não significa maturidade...

Era delicioso ouvir as histórias de viagens do casal. Eles adoravam viajar e faziam isso com bastante frequência. Viagens longas, à países distantes: Marrocos, Egito... E ela me contava das viagens mostrando as lembranças que trazia destes lugares.

Eles tinham uma filha. Mais velha do que eu e já casada nesta época. Eu não me lembro de tê-la encontrado pessoalmente, mas me lembro das fotos que minha tia me mostrava: do s eu casamento, de viagens: Chique, bonita, elegante, distante. Ela já tinha um filho, o neto adorado da minha tia, e depois teve meninos gêmeos - acho até que o primeiro caso de gêmeos que ouvi falar assim próximos. 

Não sei quando eu me distanciei ou eles se distanciaram, mas perdi completamente o contato com esta família tão importante para mim. Não sei o que aconteceu. Por muitos anos lembrei o número do telefone deles e me lembrava do endereço e do apartamento, mas nunca voltei lá ou voltei a vê-los. Por que será? Nunca saberei.


Nenhum comentário:

Postar um comentário